POR QUE SOU PRESBITERIANO? (5ª PARTE - POR SUA ÉTICA)

POR QUE SOU PRESBITERIANO?

V – POR SUA ÉTICA

Profundamente impregnada da doutrina da Soberania Divina a Igreja Presbiteriana lançou todos os seus fundamentos na Palavra de Deus.

Os grandes pensadores, filósofos e intelectuais do passado, os da época calviniana, os posteriores a João Calvino na França, na Holanda, na Inglaterra, na Escócia e em outros países, que tiveram uma ou outra convicção de natureza presbiteriana, assim como os santos homens que participaram da Assembléia de Westminster (de 1 de julho de 1646 a 22 de fevereiro de 1649) procuraram inspiração na fonte das Águas Vivas, a Bíblia Sagrada.

E, ao fim de muita busca, com a mente posta nas Escrituras como a única regra de fé e prática — foram encontrar na chamada “Oração do Senhor" a estrutura de uma ética peculiar, sem desejo de dominação, tendo por modelo a conduta do próprio Senhor Jesus Cristo. Ali, nos quatro primeiros itens ensinados pelo divino Mestre aos apóstolos, em Mt 6.9,10, estão as quatro normas fundamentais do presbiteriano. Dizem:

1ª — Pai nosso, que estás nos Céus,
2ª— Santificado seja o Teu nome.
3ª— Venha o Teu reino,
4ª— Seja feita a Tua vontade.

Os dois primeiros itens ensinam o crente a exaltar o Santíssimo nome de Deus e a glorificá-lo como convém, na sua vida diária. Nos dois seguintes ficam estabelecidas as orientações para que ele se relacione com a comunidade e, com ela, volte novamente ao Pai. Mas estritamente: nos dois primeiros está a ética do Culto; nos dois últimos, a ética da comunidade. Em todos eles se vê Deus, como elemento ativo na execução do Seu plano como Criador, para o bem de Sua criatura.

Vale a pena examinar, embora superficialmente, o desenvolvimento da obra que assim ficou estruturada. É a que segue.

a) Pai Nosso que estás nos céus

Reconhecendo a paternidade de Deus como um sublime privilégio, o presbiteriano:

1 — Presta culto racional e não só emocional. Nada de exageros nos rituais. Nem gritos, nem gemidos que denunciem excitação. Nem atitudes ou gestos que possam significar estados emocionais que cheguem ao histerismo.

A emoção, muitas vezes, tem efeitos apenas fisiológicos: é um ato do corpo, diríamos. Sendo do corpo ela afeta o organismo humano e pode tornar-se irracional. Ela costuma indicar maus estados de saúde ou de adaptação ao meio. Como está ligada às tendências do próprio indivíduo, segundo ensina a Psicologia, pode ser considerada algo egoísta. É passageira e, por ser assim, caracteriza personalidades inconstantes, inseguras. Na hora da excitação, sob a influência de imagens falsas ― vistas ou imaginadas ― busca pompa, aparato, barulho. E leva o emocionado a gestos e posturas, expressões faciais e corporais, as mais variadas. Foi talvez pensando nisto que o grande Darwin, exagerando (disse que certos gestos e atitudes do homem são lembranças do passado da raça humana. Assim, as mãos postas, lembraria o antigo costume de os vencidos implorarem misericórdia aos vencedores. Não é verdade, mas é bem achado. O certo é que numerosas atitudes no culto são expressões meramente emocionais, sem, a participação do espírito do adorador a Deus.

O culto emocional rebaixa o Criador à condição de criatura. Martiriza a criatura com manifestações fora do natural. Tira-a da condição do comum dependente de Deus para colocá-la em regiões artificiais, onde há carismas (do grego karisma, que quer dizer: um dom, um favor, uma graça). Têm sido deste tipo diversos movimentos históricos como o dos Montanistas, no século II. Eles pregavam a imediata volta de Cristo e tinham costumes severíssimos. Desapareceram na voragem do tempo. Também os Irvinguistas da Inglaterra, seguidores de Edward lrving (1792 a 1834). Formaram uma Igreja que dava muita ênfase aos dons, principalmente o da profecia e o de línguas.

Há uma parte do culto que deve falar ao coração. Mas o um coração controlado, equilibrado; não a um que se deixa vencer pela tremura, os gritos e o choro. .

2 — Vive uma fé declarada. Não implícita, subentendida, admitida mentalmente. Quem vive sua fé dispensa estardalhaço. Demonstra-a na sua conduta. "O que tu és", escreveu certo autor, "fala tão alto que não posso ouvir o que tu dizes".

Essa vida em fé formou aqueles grupos rígidos que na Inglaterra, implantaram o Puritanismo, os antecessores do moderno Presbiterianismo. Dez anos após a morte da Rainha Elisabeth I, da Inglaterra, a influência da Bíblia fez nascer no seio do povo uma onda de crentes muito rígidos quanto ao comportamento. A perseguição desencadeada pela família Stuart sacrificou muitos e levou muitos à expatriação. Entre eles os chamados "Pais Peregrinos" que lançaram os fundamentos da grande nação norte­americana, os Estados Unidos. João Milton, o segundo entre os três maiores poetas do mundo (Dante, Milton e Luiz de Camões), cego, autor de “O Paraíso Perdido”, era puritano.

3 — Conversa direta com o Pai, de coração aberto. Em oração espontânea e não em fórmulas, em rezas elaboradas por outros.

Os presbiterianos geralmente repelem orações escritas. Têm o “Pai Nosso” como um modelo de oração, pois que o Senhor Jesus disse:
"E, orando, não useis de vãs repetições, como fazem os gentios, que pensam que por muito falarem. serão ouvidos. Portanto, vós orareis assim etc." Mt 6.7,9.

A paternidade divina aí proclamada transforma o mundo numa grande família. Os horizontes alargam-se. Os ideais difundem-se. A boa vontade passa a ser uma obrigação. A paz universal deixa de ser um mito.

Sabemos que esta convicção presbiteriana — a paternidade divina, — como muitas outras, desagrada. O apego dos calvinistas às Sagradas Escrituras, a agressividade na evangelização e outros sinais da vitalidade presbiteriana provocam irritação da parte dos racionalistas e conflito constante com o mundo em geral. Mas, eles é que têm de mudar; nós, não;

4 — A convicção da paternidade divina conduz a um monoteísmo absoluto, firme, inabalável. Não se admite nenhuma participação no processo de reconciliação do homem com Deus. Ele basta. Ofereceu Seu Filho como o único instrumento e a vítima propiciatória (I Tm 2.5).

Ele mesmo não repartiu Seu poder com ninguém. Os homens é que inventaram uma multidão de intermediários que estão desviando o pensamento do homem para com o Pai, o Criador, para as criaturas.

5 — O Presbiteriano é teimoso na multiforme obra missionária. Envia a mensagem da reconciliação com o Pai a todas as terras e ilhas do mar.

No Brasil ele teve frustradas as duas primeiras tentativas de tomar pé. A primeira foi iniciada em 1555; dela participaram o próprio João Calvino e o célebre Almirante de Coligny. Teve como comandante o “Caim da América”, Almirante de França, Nicolau Durand de Villegaignon. A segunda, lá para 1640, dirigida pelo Conde holandês João Maurício de Nassau Slegen (1604 a 1678). A primeira foi na baía de Guanabara; a segunda no Nordeste do Brasil, principalmente em Pernambuco. Com a terceira tentativa, com o missionário Ashbel Green Simonton, em 1859, que desembarcou no Rio de Janeiro em 12 de agosto de 1859, foi que criou raízes.

6 — Embora dando absoluta preferência às coisas do espírito, o Presbiteriano tem grande vocação para os altos ramos do conhecimento humano. Nas suas preocupações, ele procura dominar os campos da Ciência, das Letras e das Artes.

Ao instruir seus adolescentes e sua juventude ele não impõe autoritariamente, não dogmatiza. Discute. Respeita as convicções alheias e exige respeito às suas. Quando é desafiado, então, a coisa é diferente. Bem que ele tem o que defender!

Note-se que o Presbiterianismo não encampa distorções, exageros, desvios, excessos; venham de onde vierem. Sejam internos, ou de co-irmās. Tendo a Deus como o Pai, tratamos a todos como membros de uma só família.

7— A Palavra de Deus ― que transmite a vontade do Pai — goza de absoluta primazia. Nela o Presbiterianismo crê que Deus revela o modo como exerce Sua paternidade e o homem aprende como usufruir os direitos de filiação divina. Nela se contém tudo o que é necessário e bastante para que o homem possa exaltar dignamente a Deus o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

Nela, ademais, encontramos o suficiente para a conduta pessoal.

b) Santificado seja o Teu Nome

O nome identifica aquilo que existe. Designa o ser.

O nome de Deus designa um Ente que é “espírito, infinito, eterno e imutável em Seu ser, sabedoria, poder, santidade, justiça, bondade e verdade”. Resposta completa, que foi dada à pergunta n.° 4 do “Breve Catecismo da Igreja Presbiteriana, aprovada pela Assembléia de Westminster. Acredita-se que foi revelada pelo próprio Deus, em oração pública. A Comissão do Catecismo, após meses de trabalho, não conseguia achar uma resposta satisfatória à pergunta: “Quem é Deus?”. Apresentado o relatório negativo à Comissão Geral, essa decidiu orar rogando a Deus que Se revelasse a fim de que Seus mensageiros pudessem dizer ao mundo Quem Ele era; o que era a Pessoa d’Ele. Designaram um delegado para dirigir a oração. E esse começou dizendo: “Senhor Deus, Tu que és um “espírito, infinito, eterno, e imutável etc.”. Quando ele terminou, todos se regozijavam, pois haviam achado uma concisa descrição de Deus!

Isso aconteceu há mais de 325 anos. Desde então O Presbiterianismo o vem ensinando, e a humanidade vem aprendendo a reverenciar o possuidor deste Santo Nome.

O Presbiterianismo Lhe da honra e glória e faz desse culto uma norma de vida. Dá, porque reconhece nele uma Pessoa, que disso é digna. Deus não cresce com nossa exaltação; nós é que crescemos quando O podemos exaltar. Temos que nos aperfeiçoar, elevar, santificar para entender um pouco do que são Sua majestade, perfeição, atributos, vontade, autoridade, ação, conforme registram as sagradas Escrituras.

Na sua Ética, o Presbiterianismo procura pôr em prática o que é correto nas comunicações com o dono deste Nome Santo. E ele o faz:

1 — Recomendando a maior reverência para com os Padrões da igreja (Confissão de Fé e Catecismos) porque são a essência da Palavra de Deus tornada em regras de vida. A Palavra de Deus é o máximo.

Lutero dizia: "Onde achares a Palavra, aí acharás, certamente, uma igreja". Vale a pena pensar o que seria o contrário! Por isso, para o Presbiterianismo a Bíblia é o Livro; não um livro. Não que cultuemos o volume, mas porque procuramos obedecer ao conteúdo. Quando a palavra está sendo lida, presume-se que o próprio Deus esteja falando aos fiéis. Em muitas comunidades os diáconos fecham a entrada do salão de cultos até que se conclua a leitura. Em outras, só se lê a Bíblia, com a congregação em pé. Em outras, retiram-se as criancinhas que choram durante a leitura. São algumas formas de reverência. E de educação para que as gerações futuras sigam esses exemplos ou adotem outros melhores.

2 — A hora de oração é hora de comunicação direta com Deus. Fecham-se os olhos a tudo que cerca o crente em derredor. O corpo em atitude respeitosa, a mente posta em Deus, o espírito está em condições de falar com o Pai.

O mesmo comportamento é habitual durante a celebração dos sacramentos.

3 — Recomendando insistentemente o culto individual e o culto doméstico. Ambos, diariamente.

Jesus, falando às multidões, em Mt 5,6 e 7, tratava os ouvintes de vós. Em alguns casos especiais dirigia-se pessoalmente, falando tu. Era a mensagem pessoal. O culto individual é uma convocação à comunicação pessoal com a divindade. Era um chamamento à comunhão sem ser visto das multidões.

Depois do culto individual vem o culto doméstico. É a santificação da família, cujo descuido está causando os desastres de nossos dias. O Presbiterianismo ainda recomenda o velho modelo escocês implantado por João Knox, ao regressar de Genebra. João G. Paton ―­ o grande missionário das Novas Hébridas — declarou que em sua casa começava-se e terminava-se o dia com oração a Deus. Isso aconteceu até que seu pai morreu aos 77 anos de idade. O velho lia uma porção das Escrituras, juntava-se aos presentes no cântico de um Salmo e orava. Depois, ele impunha as mãos na cabeça de cada um dos filhos, abençoando-os. Não havia pressa para ir ao mercado, nem para os negócios, nem para receber os amigos, nem para chorar qualquer mágoa, ou excitação para alegrias, nas horas do culto doméstico.

É pena que tal modelo tenha caído em desuso!

4 — Procurando bem moldar o espírito daqueles que constituirão a igreja Visível de amanhã.

O sistema Presbiteriano evita dar ênfase ao denominacionalismo. Ele alarga sua visão para os horizontes sem fim; não os concentra em individualismos. Assim, acredita que a mente da juventude precisa ser ocupada com assuntos mais edificantes e não com o sectarismo. Até no preparo do seu ministério — afamado como um dos melhores, em toda parte — ele foge de certas barreiras pouco ou nada edificantes.

O homem eleva a alma, para Cristo; eis o alvo. O cidadão para a Pátria; eis o lado cívico. Bem haja aquele educador famoso — Dr. Samuel R. Gammon, — que fez gravar como lema do colégio presbiteriano que fundou para evangelizar: "Dedicado à glória de Deus e ao progresso humano".

5 — Somando ao dever espiritual o dever social e cívico, de tal forma que os presbiterianos distinguem-se na Sociedade em que viverem como servos de Deus. Isto é honrar o nome de Deus.

Ensinar ao filho a amar a terra em que nasceu, preparar o cidadão para servi-la até para o sacrifício da própria vida quando ela correr perigo, é complemento natural dos deveres religiosos. Pagar impostos e obrigações fiscais e respeitar as autoridades, são preceitos bíblicos bastante conhecidos.

“Observaste o meu servo Jó?” (Jó 1.8) é o que inspira o Presbiterianismo a fundir caracteres que Deus possa mencionar como servos fiéis nas comunidades nacionais. Sinceridade e retidão caracterizam todos os que sabem respeitar o santo Nome de Deus.

6 — Combatendo intransigentemente certas interjeições descuidosas, em que o nome ­de Deus é pronunciado mecanicamente. Sem dúvida, há casos bem piores. Há ultrajes em expressões de uso comum. E muita gente vai falando sem pensar.

Também certos chavões em orações são desrespeito ao Nome de Deus. É que são pronunciados sem pensar na majestade de Deus, automaticamente.

7 — Oferecendo a Deus uma parte dos bens que se alcançam. Cada um, evidentemente, contribuindo conforme propôs em seu coração (II Cor. 9.7).

O Presbiterianismo tem dois sistemas de contribuição: o individual e o conciliar. No primeiro, cada indivíduo dá sua oferta ao órgão encarregado de arrecadar. No segundo, cada concílio, a partir do local, vota dotações anuais para os concílios superiores e suas iniciativas. Os concílios superiores não têm contato com os contribuintes; logo, não têm (ou não devem ter) fonte de receita própria.

A oferta individual pode ser dada de várias maneiras. É avulsa, ou em coletas levantadas em reuniões (cultuais ou outras), compromissos periódicos (mensais ou outros), dízimos, ofertas alçadas, campanhas financeiras e outras. Em todas, a mais absoluta liberdade do contribuinte, contanto que esse reconheça que as instituições precisam de contar com a contribuição dos seus adeptos. Para todos: o dever de reconhecer a necessidade que o Reino de Deus tem de viver com dignidade.

8 — Cantando, alegremente, nas reuniões públicas e particulares, Salmos, Hinos e Cânticos sacros. O Presbiterianismo prefere o canto congregacional. Gosta que todos cantem.

Lá pelo século XVI houve dúvida quanto à espécie de cânticos próprios para a Casa de Deus. É que, como sempre, alguns exageraram o sentido de Ef 5.19. Só aprovavam o cântico de Salmos. A idéia não prevaleceu. O que importa é elevarmos nossas vozes em harmonia ao Santo nome do Senhor.

Paulo e Silas deram exemplo de quanto se deve cantar. Eles cantaram na prisão, com a vida em risco, ao que se vê em Atos 16.25. OS cristãos primitivos seguiram seu caminho. Os perseguidos cantavam até nos circos onde serviriam de pasto às feras. As trevas da Idade Média fizeram recuar o entusiasmo pelo cântico, sacro. No século XVI, Lutero reanimou o cântico de louvores ao nome de Deus. Ele mesmo, dono de bela voz, era um bom compositor. Seu hino ”Castelo Forte” (Ein’ feste Burg), segundo James Moffat “o maior hino, do maior homem, do maior período da história da Alemanha” está traduzido em quase duzentas línguas. É hino 155 do “Novo Cântico”, baseado no Salmo 46.

Os Presbiterianos recomendam cantar com espírito e com a mente. Nisso, obedecendo à recomendação de 1 Co 14,15.

A contribuição presbiteriana para os hinários famosos não é numerosa. È menor do que a dos Anglicanos, dos Congregacionistas e dos Metodistas. Contudo, entre os hinos evangélicos cantados no Brasil há uma considerável contribuição de autores e tradutores presbiterianos. A. J. dos Santos Neves ―- um dos primeiros professores recebidos por A. G. Simonton no Rio de Janeiro, — Guilherme dos S. Ferreira, Júlio C. Ribeiro, José Manoel da Conceição, (ex-padre), Myron Augusto Clark, J. M. Mota Sobrinho, são alguns dos autores presbiterianos de muitos hinos que são freqüentemente cantados nos templos evangélicos do Brasil.

c) Venha O Teu reino

A raça humana não se vem entendendo bem desde tempos imemoriais. O espaço vital, o alimento, a sobrevivência, o sonho do super-homem, certos ideais e outros motivos semelhantes vêm dividindo os homens entre si. É uma desinteligência generalizada, a despeito de toda a diplomacia e de largos gestos de amizade aparente. Os condutores de homens, quando são consultados, respondem que são contra as guerras. Mas, todos os esforços para a concórdia geral, para uma convivência pacífica, para a associação ideal, para uma prestação recíproca de serviços, têm sido frustrados. Continuamos a pesquisar e a testar armas de terrível poder destruidor. Magníficos ideais são espalhados pelo vento como folhas secas. De uma hora para outra é aquela carnificina horrorosa!

Infelizmente, continuamos com umas poucas nações poderosas dividindo o bolo do resto do mundo. Essas impõem regimes políticos, organizações sociais, sistemas de vida, conceituação de valores, circulação de moeda, regras de higiene, de nutrição e até de saúde do povo. De quando em quando surge um homem a reproduzir a imagem de Nabucodonosor, ou de Átila, ou de Napoleão Bonaparte, impondo-se como tendo dons especiais. Sua pregação convence, comove, arrasta as multidões. Abala as instituições. Desperta as paixões de uns e o ódio de outros. E segue-se a confusão. E tudo volta, depois, à estaca zero zero. Assim, o reino com que nos defrontamos é de satanás, o príncipe das trevas e do sofrimento. È quem está devastando este fim de século.

Grande número de crentes piedosos faz esta petição: “Venha o Teu reino”, pensando em uma nação teocrática — governada por Deus —aqui, na Terra. Isto é errado. O reino de Deus já existe não como uma nação, um determinado povo, principalmente depois do fracasso do povo israelita como nação sacerdotal. Existe no mundo, conforme se vê em Sl 97.1,2; Sl 99.1; Mt 6.33; Lc 12.31; Jo 3.3 e mais quarenta e nove passagens especiais sobre o assunto. É que Deus não poderá abandonar Seus fiéis à influência maléfica das hostes de Satanás, castigado pela desobediência. Logo que o diabo caiu, começou a aparecer o reino de Deus com os primeiros fiéis. Os que a Ele se consagram em fé e vida são os cidadãos do Reino.

Se o mundo não vive melhores dias é porque os cidadãos do Reino de Deus não estão cumprindo melhor os seus deveres. Estão orando, rogando a vinda, teoricamente. Ou estão insensíveis enquanto o mundo procede como em Gênesis 11. Ao invés de dobrar os joelhos ao Santo Nome de Deus, revolta-se, descrê, despreza e zomba da divindade com os infiéis.

Aos filhos de Deus cumpre implantar o Seu reino no mundo. Um reino de Paz. Não será com exércitos e bombas atômicas que o reino de Deus se estabelecerá. Os Cruzados e os guerreiros dos tempos heróicos não impediram que templos cristãos fossem demolidos, ou transformados em mesquitas ou monumentos pagãos ou ruínas históricas. Não vale a pena tentar de novo uma experiência fracassada tantas vezes. O nosso testemunho é que vale.

Despretensiosamente, o Presbiterianismo tem procurado implantar o reino de Deus:

1 — Operando em harmonia com outras correntes de pensamento evangélico. Não polemizando. Até dentro dos seus muros, pouco ele ensina de suas doutrinas distintivas.

2 — Só dos oficiais (presbíteros e diáconos) exigindo a declaração de que aceitam os Padrões fundamentais — a Confissão de Fé e os dois Catecismos Presbiterianos.

3 — Procurando valorizar a personalidade humana. Ele considera cada indivíduo como uma expressão positiva, conforme ensinou o Senhor em Mt 18.12,13.
É de ver como procedem as bancas examinadoras perante as quais comparecem candidatos ao presbiterato, ao ministério e a cargos diversos. Nela têm assento presbíteros, aos quais são concedidos plenos direitos de inquirição.

4 — Respeitando a consciência individual, como um dispositivo de lei nas igrejas presbiterianas.
O voto é livre nas assembléias. Os participantes são estimulados, também, ao livre exercício do voto na vida civil.

Um antigo costume presbiteriano consistia em reouvir o plenário ao fim de uma eleição. Perguntava o presidente se a assembléia que elegera alguém não desejaria, a bem da ordem, dar unanimidade a quem só obtivera a maioria de votos dos presentes. Um processo salutar, com o qual os eleitos entravam confiantes e apoiados no exercício de sua função.

Nas assembléias locais ou conciliares, o voto do ministro tem valor igual ao do leigo. Também as investiduras (nos cargos) podem ser dadas indiferentemente.

As Comissões devem ser paritárias, isto é: número igual de presbíteros docentes e regentes.

5 ― Recusando terminantemente a interferência do Estado na religião, seja qual for. O reino de Deus nada tem a ver com o deste mundo.

Esses dois poderes têm alvo semelhante: o bem estar do indivíduo. O Estado procede coercitivamente. A igreja, amorosamente. O primeiro age na área visível, a do corpo. O segundo, na do espírito, área invisível. Os objetivos são diferentes. A Igreja não precisa do apoio do Estado para cumprir sua missão.

6 — Sendo liberal em questões não essenciais. A boa vontade entre os homens de dentro e de fora da igreja, a concórdia, muitas vezes depende de pequenas compreensões. A intransigência não resolve nada.

Há elementos secundários que, sem ferir a estrutura do sistema, podem ser objeto de transigência, dentro de limites razoáveis.

7 — Conduzindo o indivíduo dentro das regras de comportamento estabelecidas nas Sagradas Escrituras. Procurando ensinar e corrigir, antes de punir. Veja-se o Parágrafo Único do Artigo 2º do Código de Disciplina da Igreja Presbiteriana do Brasil, em vigor.

Com esses propósitos a Igreja Presbiteriana vem mantendo sua tradição. Quase a metade da Confissão de Fé e dos Catecismos de Westminster, tratando do que Deus requer do homem, estabelece as normas do seu comportamento para que o reino de Deus seja implantado na comunidade universal. "Nenhum outro formulário existe", diz ilustre teólogo, "com um desdobramento das leis de Deus em normas de vida diária maior do que ali há, oriundas dos Dez Mandamentos".

A sua aplicação tem produzido grandes homens para a humanidade. Muitos deles tornaram-se heróis nacionais, em campos os mais variados. Emanuel Kant, Thomas Carlyle, Benjamin Franklyn, João Milton (autor, cego, do “Paraíso Perdido” o segundo entre os três maiores poetas do mundo), o naturalista George Cuvier, o historiador T. B. Macauley, o herói francês Almirante Gaspar de Coligny, o rei Guilherme, o chamado “O Taciturno”, João Bunian — autor de “O Peregrino”, Theodoro Roosevelt, presidente dos Estados Unidos, o sonhador presidente Woodrow Wilson — presbítero de uma Igreja na Virgínia —, entre numerosos outros. Na ciência, no magistério de nosso País, muitos filhos desta Igreja têm realizado obra de projeção além das fronteiras do Brasil. Alguns deles: Dr. Vital Brasil, mineiro de Campanha (soro anti-ofídico], Rev. Eduardo Carlos Pereira, Rev. Erasmo de Carvalho Braga, o aritmético Rev. Antônio Trajano, o poeta Jerônimo Gueiros.

“Pelos seus frutos os conhecereis!”

Nessa linha de pensamento e ação, o Presbiterianismo vem dando o que tem para que o Reino de Deus venha a este mundo. E o faz sem uma palavra de contestação ou ofensa a outras confissões evangélicas. Reconhece e proclama que cada uma delas faz o que pode e deve. É bem verdade que, no correr do tempo, tem havido quem a ela ofereça contestação. Mas, a igreja Presbiteriana não precisa de reforma. Nem na estrutura, nem no mecanismo. Santifiquem-se os seus membros e cumpram o multissecular programa e isso basta, para a implantação do reino de Deus na Terra.

d) Seja feita ai Tua vontade

A vontade divina, no seu todo, fica além da nossa compreensão. O que dela podemos entender é só o que está na Bíblia. Muita vez até atribuímos a Deus muita coisa errada, infringimos as leis naturais, sofremos as conseqüências e, diante de um desgosto, exclamamos à guisa de consolação: “Seja feita a vontade de Deus!” Errado. Positivamente errado. Passada a crise, achamos tudo razoável, mas ficou uma blasfêmia, não é?

Relativamente ao homem, a vontade de Deus é que ele “seja perfeito e perfeitamente instruído para toda a boa obra” conforme 2 Tm 3.17. Não tocaremos esse princípio geral; ele se desdobra tanto, que exigiria um estudo muito além dos propósitos deste ensaio.

Como veremos na parte doutrinária, Deus tem um plano a nosso respeito. Essa vontade manifesta-se, mas não nos impele, ou obriga, a fazer isto ou aquilo.

Quando oramos “Seja feita a Tua vontade”, estamos declarando nossa obediência espontânea ao plano de Deus, seja ele qual for. Até contra nossas esperanças. Estamos, assim, renunciando grande parte de nós mesmos, de nossos ideais (por vezes inconfessáveis), de nossos prazeres, de nossas tendências, de nossas preferências, de nossos preconceitos — freqüentemente vazios e estúpidos, ― de nossa personalidade, enfim.

Isso não vai ao ponto de querer dizer que pedimos a Deus para perder nossa consciência, nossa faculdade de discernimento, nossa reflexão, nosso direito de escolher e de formar propósitos. Entre aqueles e esses há fronteira bem fácil de caracterizar-se. Pedir isso seria pedir o aniquilamento — condição, na qual, o próprio culto perderia o valor —. É o caso que a gente tem fome. Tem apetite. O apetite sugere o desejo de comer. A vontade faz procurar o alimento e fiscaliza a quantidade a ingerir. Cada função a seu tempo.

O homem que cresce em perfeição e que se instrui para toda a boa obra vive em justiça e paz. É fator de bem-estar. Contribui para formar aquele ambiente em que há oportunidade para todos na escola, no emprego, na sociedade, à mesa, no divertimento. Quando em alta posição, em situação de comando, distribui justiça, promove a comunhão dos comandados. Quanto dela depender, estimula a harmonia entre o capital e o trabalho. Homens dessa qualidade formaram aquela sociedade cujo modelo foi traçado por Jesus Cristo no Sermão do Monte. E teriam dado ao mundo aquela sociedade de paz e compreensão universal pregada na epístola de São Tiago. Se não deram é porque o mundo não aceitou a mensagem.

Os israelitas, erradamente convencidos de que Deus (Jeová) era só deles e para eles, fracassaram no destino de implantar o reino de Deus na terr. Seria bom que os cristãos se alertassem com tempo para não incorrerem no mesmo erro.

O que tenho visto nos meus cinqüenta e nove anos de profissão de fé presbiteriana tem sido um esforço concentrado no sentido de:

1 — Adotar padrões espirituais e morais (Confissão de Fé e Catecismos) inspiradores de consagração prática, efetiva, concreta.

Não são modelos de controvérsia, de debate. Nem de suplantação de contendores, que isso não é objeto de preocupação do presbiterianismo. São de ação positiva por Cristo e sua igreja num mundo mergulhado em pecado.

2 — Comunicações irênicas — pacíficas e pacifistas ― com todos os de fora e, principalmente, com os outros ramos da árvore evangélica. Nos congressos, nas conferências, nas reuniões de esforço conjunto, os presbiterianos procedem como elementos conciliadores e moderadores de impulsos.

Os presidentes de nossos concílios eram chamados “Moderadores”. Ainda o são na Escócia, na, Suíça, na França, nos Estados Unidos, etc. O título tinha razão de ser. Traduzia o espírito denominacional de evitar excessos em todos os sentidos, moderando atitudes que, habitualmente, levam à fragmentação. O exemplo viria, assim, de cima.

3 — Ter Jesus Cristo como o centro da pregação.

O denominacionismo, o ritualismo, a ênfase a determinadas ordenanças, as formalidades (algumas vezes excêntricas e até ridículas) costumam não ser objeto de nossas preocupações. Nem de nossas prédicas.

4 — Cooperar com as demais instituições nas obras de boa vontade, sejam quais forem. As sociedades internas (de homens, senhoras, jovens e crianças) programam isto, anualmente como parte de suas atividades essenciais.

Os presbiterianos respondem à convocação nos hospitais, asilos, lares pobres, favelas, Santas Casas de Misericórdia, Sociedades de S. Vicente de Paulo e outras. Em tempo de paz, como em tempo de guerra, têm sido amigos de quem deles carece.

5 — Oferecer, quando efetivamente praticado, um modelo de comunidade democrática. É o sacerdócio ― universal dos crentes e a petição para que a vontade de Deus seja feita na Terra, são elementos decisivos na forma de uma sociedade Cristocêntrica, com uma só classe social. Sem grandes e sem privilegiados, como deve ser o verdadeiro Reino de Deus na Terra.