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sexta-feira, 10 de abril de 2009

Por que os Protestantes Históricos no Brasil Nunca Tiveram um Canal de Televisão - Augustus Nicodemus Lopes

Semana passada, quando a mídia cobriu exaustivamente a decretação da prisão preventiva de Estêvam e Sônia Hernandes, donos da Renascer, li na Folha de São Paulo que o lema do casal, quando fundou a igreja, era "ganhar o Brasil e o mundo através da mídia". E de fato, estavam caminhando para isso. Donos de um canal de televisão e dezenas de emissoras de rádio pelo Brasil, onde tinham aberto cerca de 1.500 igrejas, a denominação do casal Hernandes só perdia em números para a Universal do Reino de Deus, a maior igreja neopentecostal do Brasil.

O poder da mídia na formação e crescimento de novas igrejas no Brasil é evidente. As duas maiores igrejas neopentecostais do Brasil, a Universal e a Renascer, são donas de canais de TV e emissoras de rádio. Mesmo denominações neopentecostais menores, como Deus é Amor, investem pesado no rádio. E as igrejas históricas, como presbiterianas, batistas, congregacionais, por exemplo? Afinal, estamos aqui no Brasil há mais de cem anos, enquanto que a Renascer tem 25 anos.

Os motivos pelos quais, na minha avaliação, as igrejas históricas nunca ocuparam -- e dificilmente ocuparão -- espaço significativo no rádio e na televisão, são os seguintes:

1) Falta de interesse maior na pregação feita pelo rádio e pela televisão, gerada pela desconfiança intrínseca quanto aos resultados da mídia, uma vez que as igrejas tradicionais sempre focam no discipulado. A mídia é insuperável para marcar a presença e a identidade de igrejas, mas o retorno em termos de fiéis comprometidos e doutrinados é baixo. Pesquisa feita há dez anos por Thom Rainer nos Estados Unidos entre igrejas tradicionais mostrou que os métodos que continuam enchendo igrejas com membros consistentes são a pregação bíblica dos púlpitos, a escola dominical e o evangelismo por amizade (Thom Rainer, Effective Evangelistic Churches: Successful Churches Reveal what Works and what Doesn't, 1996). Pode ser que essa realidade mudou agora, mas duvido muito. Além disso, depois que a televisão foi dominada por programas neopentecostais evangélicos e católicos, ficou "queimada", no dizer de um amigo meu, como veículo de credibilidade para transmitir a mensagem séria e fiel da Palavra de Deus, afastando ainda mais os tradicionais.

2) Escândalos acontecidos com televangelistas geralmente ganham repercussão nacional na mídia e respingam sobre todos os evangélicos. E não são poucos os acontecidos nos últimos dez anos: Jimmy Swaggart, Rex Humbard, Jim Bakker, Ted Haggard, Caio Fábio, e agora os Hernandes, para mencionar alguns. A mídia dá enorme destaque aos televangelistas quando cometem erros, especialmente de natureza sexual e financeira. Por isso, muitas igrejas históricas são avessas a holofotes demais para seus ministros. Por falar em escândalos, investigações recentes da Polícia Federal sobre "rádios piratas" na grande São Paulo identificam que boa parte delas são de igrejas evangélicas ou operadas por elas.

3) As denominações são estruturadas hierarquicamente e não são de uma pessoa só, ao contrário das igrejas neopentecostais que têm fundadores, como a Universal, Renascer e Deus é Amor. Não resta dúvida nessas igrejas quem vai empunhar o microfone em frente às câmeras: é o fundador e dono, ou quem ele permitir. Nas igrejas tradicionais isso geraria um problema que nem sempre se resolve em termos de mérito e capacidade: quem vai ser o apresentador e o pregador principal?

4) As igrejas históricas têm capacidade reduzida de alavancar grandes recursos e somas vultosas de dinheiro a curto prazo. Igrejas e pastores tradicionais têm escrúpulos de pedir muito dinheiro aos fiéis e infiéis, especialmente para programas de televisão. Não funciona mesmo. E mesmo que pedissem e recebessem, esbarrariam na questão da contabilização: grande parte dos recursos contabilizados pode ir para o fisco. Contabilizamos ou não? Quem decide? O assunto vai parar em algum concílio pelas vias hierárquicas e quando a decisão chegar, já passou a oportunidade de comprar o canal de televisão ou programa de rádio.

5) As igrejas tradicionais [ainda] não têm apóstolos que possam assegurar ao povo que Deus vai dar um canal de televisão à denominação se todos contribuirem com tudo o que tiverem. Oral Roberts e T. L. Orborn chegaram a afirmar que morreriam ou seriam punidos por Deus se o povo não levantasse milhões e milhões de dólares para construção de igrejas e programas de mídia. Dificilmente os presbiterianos acreditariam se eu viesse com essa história...

6) Igrejas tradicionais não elegeram políticos que podem apadrinhar as concessões. As igrejas neopentecostais foram mais espertas e elegeram deputados e senadores que certamente terão condições de dar uma palavrinha nos órgãos governamentais a favor de concessões para suas denominações. As igrejas históricas sempre terão dificuldades nessa área, especialmente as reformadas, que vêm os políticos evangélicos, não como tarefeiros das igrejas, mas como responsáveis pela coisa pública e pelo bem comum. E como sem o apadrinhamento político dificilmente se consegue espaço hoje na grande mídia, as igrejas históricas permanecerão à parte por mais tempo.

7) Igrejas tradicionais teriam muitos problemas na hora de alugar o tempo de sua rede de televisão particular. As igrejas que têm uma estação de televisão geralmente ocupam apenas uma parte do tempo e o restante do segmento tem que ser alugado para que gere recursos -- vide a Record e a RIT (do R.R. Soares). E nessa hora, as denominações históricas teriam escrúpulos para alugar esse segmento para programas de conotação sexual, baixaria, violência, etc. etc. Se forem alugar o segmento somente para programas limpos, jamais poderão pagar as despesas de manutenção do canal no ar. E agora?

Eu lamento muito que nós, protestantes históricos, perdemos o bonde nessa área. Talvez não seja tarde ainda para sonhar que um dia poderemos ter muitos bons programas de rádio e televisão alcançando o país, voltados genuinamente para a promoção da glória de Deus, a salvação de pecadores e a edificação da Igreja de Cristo, em vez de veículos de promoção pessoal.

Fonte: http://tempora-mores.blogspot.com

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